quarta-feira, 30 de maio de 2012

Públicado pelo Jornal, O Mirante

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Especial Festa do Bodo

José Antunes aprendeu a arte numa altura em que era exigida dedicação total
O alfaiate dos fatos de equitação que nunca andou a cavalo

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Ia do Pinheiro Grande para a Golegã de bicicleta fizesse calor ou chuva e era de bicicleta que ia entregar as encomendas aos clientes.

Edição de 2011-06-02
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José Antunes trabalhou uma vida inteira na Alfaiataria Amaral em Azinhaga, concelho da Golegã, que fechou com a morte do proprietário. José Antunes, 69 anos, assume-se agora como o único alfaiate de trajes de equitação das redondezas. Numa pequena casa no centro da localidade virada para a estátua de José Saramago, o alfaiate que começou na profissão aos 17 anos acaba um fato de montar à portuguesa. Em cima do balcão há revistas de equitação e tauromaquia de onde são retirados os modelos das jaquetas, coletes, calças… num dos cantos sobressai uma máquina de costura Phoenix com mais de 50 anos.
O negócio já não é como antigamente, porque agora praticamente só faz emendas de roupas compradas em prontos-a-vestir e trajes de equitação, que aparecem de vez em quando. Fatos destes são para usar em festas e acabam por durar quase uma vida inteira. Começou na profissão aos 17 anos. Ia de bicicleta de Pinheiro Grande (Chamusca) para a Azinhaga. Chegava a fazer o caminho no inverno pelas estradas submersas pelas cheias com água pela cintura. Para o trabalho não se atrasar e porque a viagem ainda era longa, acabou por começar a ficar a dormir em casa do patrão, Fernando Amaral.
José Antunes recorda-se do tempo em que trabalhava 30 horas seguidas para acabar os fatos. Depois ainda tinha que se montar na bicicleta e ir entrega-los aos clientes na Golegã, em Vila Nova da Barquinha e nas redondezas. Agora são as pessoas que o procuram, que vão buscar os fatos. No pequeno espaço de paredes caiadas com muitos anos destaca-se um espelho com dois metros que brinda quem lá entra com a frase: “Eu vou ser visto assim…”. O homem que vai costurando para se manter ocupado já fez centenas de fatos que dão colorido a festas como a Feira do Cavalo na Golegã. Mas nunca envergou um fato desses porque não tem cavalo e não sabe montar.
O alfaiate já fez fatos pretos, castanhos, de vários feitios e tamanhos, para serem usados por pessoas de várias zonas que gostam das tradições e os passeiam a cavalo. Já foi procurado por pessoas de norte a sul do país, e até dos Açores. Também já fez para espanhóis. Um fato de equitação à portuguesa, à antiga portuguesa, ou à espanhola demora a fazer quatro a cinco dias, praticamente de sol a sol. Os cortes, o coser mangas ou golas, os forros com linhas que formam desenhos que fazem lembrar flores, tudo é feito de forma artesanal. Um trabalho, que diz o alfaiate, “não mata mas mói”. Mas apesar das dores das costas, que têm que estar dobradas para melhor precisão no corte dos tecidos ou no vaivém da agulha da máquina a pedal, no final de cada encomenda sente-se realizado por verificar que o que faz, é muito mais que simples costura e pode, em certos casos, ser considerado arte.
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1 comentário:

  1. Excelente "viagem" às memórias de muitos de nós que ainda tivemos a oportunidade de termos passado pelas mãos artísticas dos "velhos" alfaiates! Nas aldeias, na minha aldeia, também houve vários desses "artistas" que se dedicaram à profissão de confeccionar roupa por medida!!!

    Eram tempos em que o tempo permitia "saborear" a vida de outra maneira!!Primeiro era a sessão para tirar as medidas e depois, ainda antes da entrega final do fato, a prova final, não fosse o mestre alfaiate se ter enganado nalguma medição!!!
    Velhos tempos em que os "velhos" alfaites eram normalmente pessoas respeitáveis e depositárias de muita sabedoria que a todos nós encantava sempre que e eles nos dirigíamos para requisitar os seus serviços!!!

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